Sunday, October 07, 2007

Pilar, minha querida Pilar...


Estou procurando uma maneira de dizer que estou apaixonado por você de uma forma que ainda não tenha ouvido. Não que eu tema a sua reação ao escutar o que vou dizer, minha doce Pilar. E por quê? Porque estou cansado de amar esse vazio que o amor ora traz, ora leva consigo e me deixa sem mim. Mas mesmo assim, eu gostaria de me precipitar diante do abismo e dizer que amo, - assim mesmo - rapidamente, repentinamente como uma chuva que não se espera quando se quer ir à praia ver o pôr do sol às cinco e meia da tarde.
Bom, acho que a amo ou pelo menos é isso que estou escrevendo agora para você, com toda a agonia e ansiedade que estão presentes em uma declaração, mesmo as feitas às pressas aproveitando o que o sopro divino recita-me aos ouvidos. Por isso minha Pilar, desculpe-me os erros e as palavras mal postas e mal-entonadas, (que pra minha sorte ou azar você ainda não pode ouvir)... Vê ou pressente que da confusão se fez a carta?
Mas você poderia se perguntar: mas meu ilustre desconhecido, como você pode dizer que me ama, se de mim não sabe nada? Não dá pra entender isso. Como um ilustre desconhecido, dir-lhe-ia que eu estou cansado de entender isso, de escrever sobre isso, sem, no entanto sentir isso, aproveitei o momento para lhe dizer logo, antes que eu entenda o que sinto, e isso deixe de ser aquilo que pensei ser.
Passei a lhe amar, de forma ousada e sem pedir permissão, aliás, acho que é assim que se ama, desconhecendo limites quaisquer que sejam, e aproveitando o momento para que se diga aquilo que se tem pra dizer, seja a quem for, acredito minha Pilar que não é minha ainda, que toda declaração deve ser entregue ao seu destinatário, para não correr o risco de pecarmos por omissão, o que nos torna muito mais amargurados por não ter aproveitado o momento e ter transformado a possibilidade em impossibilidade por nossa culpa, e pelo lapso temporal entre o dito e o não dito, que daqui a dois segundo poderá ser falado por outra pessoa, e vou sofrer o não dito, pelo dito.
Como ia lhe dizendo nessa prosa, passei a lhe amar, Pilar, quando vi o seu sorriso gratuito e não burocrático, e mesmo que ele não tenha sido destinado a mim, coloquei-me entre ele e o seu destinatário, que na minha opinião não merecia tamanha beleza, por acha-lo incapaz de entender e ama-lo como o amei naquela hora precisa. Amei você um pouco mais quando senti o seu cheiro, mesmo sabendo que você não se perfumou pra mim, mas mesmo assim, traguei-a pelas narinas, e senti o fluxo do meu sangue se alterar pela presença de uma substância estranha misturada aos seus glóbulos brancos e vermelhos e plaquetas e hemácias e tudo mais que faz o sangue vermelho e fluido. Senti também no meu corpo a vontade docemente libidinosa de ter aquele aroma transfigurado em carne, em caricias, em carinho, em gozo, em gritos, e em tudo o mais que se passou por minha cabeça naquele momento, minha amada Pilar.
Repetidamente, e num curto espaço de tempo, passei a lhe amar, Pilar, quando vi o seu caminhado (ou teria sido o seu rebolado, confesso ter sido o poema mais lindo que já li silenciosamente, muito embora o meu corpo gritasse que lhe desejava), pois naquele momento você passou por mim me reduzindo ao que eu era, a minha condição de existência, um ser invisível, me tornou o que eu realmente era, longe de minhas pretensões, mais uma pessoa das tantas que passaram por você naquele dia, que sentiram seu cheiro, que pensaram tolices ao ver o seu caminhado, que lhe desejaram à sua maneira para si. E sendo assim, não precisou ensaiar nenhum sorriso de propaganda de agência bancária, ou mesmo fazer o cumprimento nosso de cada dia: “oi” , “tudo bem?” de forma mecânica e desinteressada. E pude então vê-la como você me via, na sua essência, na sua forma e na sua beleza. Foi naquela hora, que não nos ligávamos que passei a amar você, pelo seu silêncio indiferente e pela sua naturalidade em ser você, sem querer parecer com nada além de tudo isso, Pilar.
Confesso que amei você naquele instante, pela falta de algo melhor pra fazer, de algo melhor para lhe dar, então resolvi me dar a você, mesmo sendo apenas um ilustre e ousado desconhecido, que resolveu amar uma passagem, um raro momento em que somos nós mesmos e deixamos de ser aquilo que vemos. Por isso, Pilar resolvi escrever essa carta, enquanto voce passa por mim, e as palavras não a acompanham juntamente com meu olhar e minha imaginação. Está sendo uma trabalheira enorme manter o equilíbrio desequilibrado pela sua passagem por mim.
Então, como sei que o tempo urge e não nos dá oportunidade de repetir um gesto, mesmo sendo ele o mais simples possível, se torna impossível; estou lhe entregando esta carta para que isso tudo chegue às suas mãos, aos seus olhos e ao seu coração. Pois aos escravos do tempo não lhes é permitido parar de correr de um ponto a outro, sem parar em nenhum deles, e como não terei tempo para chegar aos seus ouvidos para colocar o meu amor onde ele deve ser colocado, coloco-o aqui, para que ele permeie os seus olhos e eu deixe de ser um ilustre desconhecido e passe a ser visível para voce, Pilar...


Apressadamente, Ilustre desconhecido...



Xico Fredson...

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