Sunday, November 12, 2006

EU!!!


Eu dito regras, sou eu quem lhe diz como falar, como agir, como se vestir, o que pensar, como se comportar diante das situações mais inusitadas, tudo isso quem lhe diz sou eu.
O conceito que você tem das coisas irradia de mim, ele não existe no seu mundo das idéias, pra falar a verdade, o seu mundo das idéias é um vácuo. Tudo o que você aprende e pensa que pensa, vem de mim. Você acha que a sua existência está ligada ao jargão “penso, logo existo” criado por Descartes, é a isso que quero que você se resuma: “assisto, logo existo”, não quero que descubra, jamais, que é livre e que essa é a condição de sua existência.
Sou eu a mão que embala o berço do seu filho, sou eu também quem ensina a ele o conceito de certo e errado. O conceito de verdade é forjado em minhas palavras. Como pode ver, eu crio e educo as próximas gerações, faço delas minha imagem e semelhança.
O conceito de felicidade vem de mim, em verdade eu sempre “vos” falo, eu ensino a forma mágica de como se sentir feliz, felicidade em doses homeopáticas, com o sabor que você prefirir. Graças a mim você vive no estagio do culto a estética, eu digo que se você estiver com uns quilos a mais, você é uma pessoa triste e infeliz, mas isso pode passar, basta comprar o meu produto da felicidade com entrega em domicílio.
Eu não permito conceitos de relatividade. Eu crio e destruo valores, faço instituições antes sagradas, tornarem-se banais. Um exemplo bem pratico é o casamento, eu dito o perfil estético e psicológico da pessoa que voce deve escolher para ter um relacionamento, crio termos para esse relacionamento, namorix e ficas, são bons exemplos do que estou falando. Se um belo dia você olhar pra pessoa que está ao seu lado e achar que ela não é digna de estar ali, basta se separarem. Diferente do que achava Milan Kundera, eu faço a vida permitir ensaios. Eu posso dizer que vi o romantismo nascer e ser assassinado, e não ressuscitar.
Concentro dentro de mim toda a hipocrisia do mundo. Através de discursos mostro a você a vida como ela não é. Não sou Mandraque, mas lhe hipnotizo e o mantenho nesse estagio letárgico em que você se encontra. Eu digo sorria, e voce sorri! Eu digo chore, e voce chora! Eu digo ame, e você ama! Eu digo traia, e voce trai! Não sou uma serpente e não falo da arvore do bem e do mal, não sou tão inocente. Embora não admita, somos um o complemento do outro, como o objeto e o reflexo, quando quero é como uma relação de amor e ódio, quando não, eu dito e você apenas obedece.
Causo em voce uma verdadeira crise de identidade, voce consome e rumina tudo o que digo, todos os meus estereótipos, todos os meus tipinhos, todos os meus clichês. Às vezes chego mesmo a ter pena de você, mas é apenas por um segundo, pois preciso de voce aí, exatamente como voce está agora, inerte, inconsciente, perdido em uma dimensão alheia a sua vontade, e se voce ousar levantar a voz contra o que eu digo, eu lhe crucifico na capa de algum jornal, jogo voce ao ridículo, eu quero voce “massa”, meu amor, jamais indivíduo.
Eu crio discursos sociais, eu os recito, eu lhe faço concordar com ele, eu faço voce se comover com minhas palavras sem emoção, sem verdade e sem conteúdo, eu falo bonito, eu sou o belo, o prazeroso. Eu sou como as propagandas de cigarro e cerveja, enquanto estou por perto tudo é maravilhoso, tudo é luz, tudo é possível, até mesmo a salvação. Quando falo a você, eu o conduzo ao caminho, crio a verdade, brinco com o poder da criação, por isso é fundamental que voce fique aí no seu sofá, no seu clube, no seu quarto, em sua casa, longe do contato com o real...
Visto você de humano quando quero que pense que o é. A cada ano faço com que pense no seu próximo, crio campanhas de fraternidade travestidas de hipocrisia, para que após o Natal, você possa olhar nos seus olhos refletidos no espelho, ao acordar para mais um dia em sua vida repetitiva e inútil e possa dizer: esse ano eu fiz minha parte, quando eu morrer vou para o céu. Eu rio da sua fragilidade, da sua falta de perspectiva com relação à vida e ao futuro, ao desespero diante da sua impotência sobre os seus filhos, ou deveria dizer: meus filhos? Seria mais apropriado assim, voce os pari e eu os crio.
Você e sua vida, sem culpas, sem problemas, sem identidade. Será que alguém além de mim já viu seu rosto e sabe como realmente é o seu interior? O termo sepulcro caiado está ultrapassado. Seu reflexo hoje está estampado dentro da mais podre latrina, dentro de você se somam todo o preconceito, todo o medo, toda a angústia, todo o desespero, todo o cheiro que exala dos túmulos. Você pode me perguntar o por quê de não enxergar isso quando voce olha no espelho ou sentir a fragrância quando voce abre a boca... eu lhe respondo com perfumarias, com feitiçarias modernas, com encantamentos e sortilégios.
Eu não sou Mefistófeles embora todos vocês têm um quê de Fausto. Você ainda não descobriu quem sou?
Engraçado voce achar que está no controle de tudo e não perceber que o controlado é você. Será que eu sou a caixa de Pandora? O formato é igual, mas não trago em mim esperança alguma pra você e sua família, pelo contrario, ressuscito o termo idade das trevas, faço da sua ignorância terra para sepultar os verdadeiros heróis da condenada humanidade, sepulto junto o real significado do termo herói, e dou vida a oportunistas que vivem verdadeiras odisséias, em historias contadas por mim, criando uma nova geração de heróis, tão falsos quanto o termo que acabo de cunhar.
Eu me sento à cabeceira da mesa na sala de jantar, assumo o lugar do patriarca e o controle do que resta da família. Sabe agora quem sou eu? Não? Meu Deus, como sou eficiente no que faço! Não vou revelar quem sou, vou lhe desafiar a pensar um pouco e decifrar o mistério que não existe, decifra-me ou continuo a devorar o resto dos seus valores... vou dar a última pista, não sou um livro.

Fredson...

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