Sunday, October 07, 2007

Indo... Sem rumo

Indo...

Indo... Cada vez mais indo: seguindo; partindo; caindo; subindo, indo. Com ou sem prefixo: vou seguindo, às vezes dentro de mim, noutras fora, pelas estradas, comendo poeira e o pão que diabo esqueceu de amaçar, vendo algumas paisagens monotonas e algumas dinâmicas. Ouvindo os cantos, os pesares, os ais. Vendo e revendo, visitando e descobrindo. Vendo as lavadeiras à beira dos açudes lavando e sorrindo com suas cantilenas antigas, que suas avós um dia cantaram. Em minha passagem por esse mundo de meu Deus vejo as moças nas sacadas dos apartamentos cantando os refrões dos últimos sucessos musicais. Andando pelo centro de uma cidade que dorme, recebo uma piscadela duma estrela-fria-decaída em uma esquina, à procura de um corpo quente para levá-la ao firmamento novamente, mesmo que por trinta moedas. Vejo e sinto tanta coisa nesse mundo em que os seus viventes se ignoram, que dá vontade de seguir sempre sem parar, daqui pra li, de lá pra cá, sem nó, sem amarra. Vivendo num gerúndio sem fim, como um cão correndo atrás do próprio rabo...

...Sem rumo

De onde nem pra onde, nao sei. Tudo o que sei é que sigo na busca daquilo que sempre insiste em fugir de mim, desse horizonte que se apresenta sempre tão distante dos meus braços, muito embora esteja perto dos meus olhos. Essa utopia que insiste em dar dois passos sempre que dou um. Desse sorriso que disfarça quando olho, dessa urgência que cessa quando acalento; dessa canção que alguém que anda ao meu lado assovia, a melodia me parece Beatles, mas não conheço a letra. Sigo como um cego a confiar nos meus olhos caninos que me guiam por entre as pessoas e coisas que me rodeiam. Mas trago sempre um sorriso diferente para cada situação que se apresenta aos meus ouvidos. Mas sempre um sorriso...


Xico Fredson

Sobre o Tempo e a Eternidade!!!

Tempo, eis a nossa matéria-prima, e no entanto vivemos a lamentar a falta dele, paradoxalmente adiando tudo para um amanhã que não sabemos se podemos contar com ele. Então pensamos, no silêncio solitário da noite, enquanto fazemos alguma coisa mais urgente que viver a vida:.
Quem sabe um dia a gente não vai se encontrar novamente, e dessa vez com um pouco mais de tempo e eu poderei me concentrar nos teus olhos com mais calma, sem precisar me preocupar com que horas sejam...
Quem sabe um dia a gente não possa conversar sobre aquele assunto que há tanto tempo vem sendo deixado de lado justamente pela falta de tempo...
Quem sabe um dia eu poderei distinguir desejo de viver da ânsia pela vida...
Quem sabe um dia eu poderei ler aqueles livros que estão na prateleira, assistir aos filmes que já saíram de cartaz, ver os quadros que estão expostos na galeria, sentar e ficar vendo uma criança brincar, quem sabe um dia eu terei tempo pra viver...
Quem sabe um dia terei tempo pra aprender a cantar aquela canção por completo ao invés de repetir apenas o refrão dela...
Quem sabe um dia terei tempo para ouvir as aventuras narradas por meu filho...
Quem sabe um dia poderei me transformar no herói que ele acha que sou...
Quem sabe um dia ignorarei minha qualidade defeituosa de adulto e voltarei a ser criança, nem que seja por algumas horas só pra brincar de soltar pipa com meu guri, para corrermos por aí juntos, pra tomarmos banho de chuva, pra andarmos de bicicleta, para cairmos e nos levantarmos novamente, quem sabe...
Quem sabe um dia eu pare de perder tempo procurando a perfeição em alguém e passe a aceitar as pessoas como elas são, com sua fúria e sua calma, com todas as suas virtudes e defeitos, em toda sua individualidade...
Quem sabe um dia terei tempo para falar ou berrar tudo aquilo que sinto vontade de falar e não faço por medo ou falta de tempo...
Quem sabe um dia terei tempo e coragem para desligar a tevê e abrir um livro, pensar ao invés de receber tudo pronto para ser ruminado...
Quem sabe um dia terei tempo para saborear uma fruta tirada do cacho, o aroma de uma flor, o cheiro de uma comida sendo preparada, degustar uma comida recém-preparada sem pressa, mastigá-la ao invés de engoli-la...
Quem sabe um dia terei tempo para andar descalço de pijama pela casa, sem me preocupar com a hora de ir trabalhar, ficar deitado na cama até mais tarde, ficar olhando pro teto, ficar revendo velhas fotos, ouvindo musicas antigas, aquelas que servem como uma espécie de marca texto em nossa vida, aquela musica que nos arrebata a um lugar especial que está guardado dentro de nós em algum lugar estranho aos demais e que só se torna perceptível quando soltamos aquele sorriso nostálgico que nem todos percebem....assistir a filmes antigos, aqueles que deixaram de ser lançamento faz tempo, mas que não perderam sua mensagem, como o filme “Minha Amada Imortal” todo mundo tem um filme ou uma musica em especial, se voce sorriu agora é porque lembrou de algum...
Quem sabe um dia terei tempo para parar e dizer a voce o quanto é importante pra mim, o quanto preciso do seu sorriso, do seu beijo, de ouvir sua voz, de sentir apenas a sua presença junto a mim, mesmo que não diga nada, mas só a certeza de ter voce junto a mim já é motivo pra não temer nada, nem mesmo a as coisas da vida...
Quem sabe um dia façamos aquela viagem que há tanto vimos combinando, mas pela falta de tempo, ainda não a fizemos...
Quem sabe um dia eu deixarei de ter pressa e aprenda a apreciar a beleza fugaz de um pôr-do-sol...
Quem sabe um dia eu faça longas caminhadas sozinho, sentindo apenas o peso do meu corpo sobre os meus pés e ouvindo o som dos meus passos, para recuperar o tempo que perdi sempre ouvindo os passos alheios sem me dar a devida atenção...
Quem sabe um dia eu pare de perder tempo e comece a viver e termine esse poema, mas agora eu preciso sair, o sinal vai abrir...


Xico Fredson...

Pilar, minha querida Pilar...


Estou procurando uma maneira de dizer que estou apaixonado por você de uma forma que ainda não tenha ouvido. Não que eu tema a sua reação ao escutar o que vou dizer, minha doce Pilar. E por quê? Porque estou cansado de amar esse vazio que o amor ora traz, ora leva consigo e me deixa sem mim. Mas mesmo assim, eu gostaria de me precipitar diante do abismo e dizer que amo, - assim mesmo - rapidamente, repentinamente como uma chuva que não se espera quando se quer ir à praia ver o pôr do sol às cinco e meia da tarde.
Bom, acho que a amo ou pelo menos é isso que estou escrevendo agora para você, com toda a agonia e ansiedade que estão presentes em uma declaração, mesmo as feitas às pressas aproveitando o que o sopro divino recita-me aos ouvidos. Por isso minha Pilar, desculpe-me os erros e as palavras mal postas e mal-entonadas, (que pra minha sorte ou azar você ainda não pode ouvir)... Vê ou pressente que da confusão se fez a carta?
Mas você poderia se perguntar: mas meu ilustre desconhecido, como você pode dizer que me ama, se de mim não sabe nada? Não dá pra entender isso. Como um ilustre desconhecido, dir-lhe-ia que eu estou cansado de entender isso, de escrever sobre isso, sem, no entanto sentir isso, aproveitei o momento para lhe dizer logo, antes que eu entenda o que sinto, e isso deixe de ser aquilo que pensei ser.
Passei a lhe amar, de forma ousada e sem pedir permissão, aliás, acho que é assim que se ama, desconhecendo limites quaisquer que sejam, e aproveitando o momento para que se diga aquilo que se tem pra dizer, seja a quem for, acredito minha Pilar que não é minha ainda, que toda declaração deve ser entregue ao seu destinatário, para não correr o risco de pecarmos por omissão, o que nos torna muito mais amargurados por não ter aproveitado o momento e ter transformado a possibilidade em impossibilidade por nossa culpa, e pelo lapso temporal entre o dito e o não dito, que daqui a dois segundo poderá ser falado por outra pessoa, e vou sofrer o não dito, pelo dito.
Como ia lhe dizendo nessa prosa, passei a lhe amar, Pilar, quando vi o seu sorriso gratuito e não burocrático, e mesmo que ele não tenha sido destinado a mim, coloquei-me entre ele e o seu destinatário, que na minha opinião não merecia tamanha beleza, por acha-lo incapaz de entender e ama-lo como o amei naquela hora precisa. Amei você um pouco mais quando senti o seu cheiro, mesmo sabendo que você não se perfumou pra mim, mas mesmo assim, traguei-a pelas narinas, e senti o fluxo do meu sangue se alterar pela presença de uma substância estranha misturada aos seus glóbulos brancos e vermelhos e plaquetas e hemácias e tudo mais que faz o sangue vermelho e fluido. Senti também no meu corpo a vontade docemente libidinosa de ter aquele aroma transfigurado em carne, em caricias, em carinho, em gozo, em gritos, e em tudo o mais que se passou por minha cabeça naquele momento, minha amada Pilar.
Repetidamente, e num curto espaço de tempo, passei a lhe amar, Pilar, quando vi o seu caminhado (ou teria sido o seu rebolado, confesso ter sido o poema mais lindo que já li silenciosamente, muito embora o meu corpo gritasse que lhe desejava), pois naquele momento você passou por mim me reduzindo ao que eu era, a minha condição de existência, um ser invisível, me tornou o que eu realmente era, longe de minhas pretensões, mais uma pessoa das tantas que passaram por você naquele dia, que sentiram seu cheiro, que pensaram tolices ao ver o seu caminhado, que lhe desejaram à sua maneira para si. E sendo assim, não precisou ensaiar nenhum sorriso de propaganda de agência bancária, ou mesmo fazer o cumprimento nosso de cada dia: “oi” , “tudo bem?” de forma mecânica e desinteressada. E pude então vê-la como você me via, na sua essência, na sua forma e na sua beleza. Foi naquela hora, que não nos ligávamos que passei a amar você, pelo seu silêncio indiferente e pela sua naturalidade em ser você, sem querer parecer com nada além de tudo isso, Pilar.
Confesso que amei você naquele instante, pela falta de algo melhor pra fazer, de algo melhor para lhe dar, então resolvi me dar a você, mesmo sendo apenas um ilustre e ousado desconhecido, que resolveu amar uma passagem, um raro momento em que somos nós mesmos e deixamos de ser aquilo que vemos. Por isso, Pilar resolvi escrever essa carta, enquanto voce passa por mim, e as palavras não a acompanham juntamente com meu olhar e minha imaginação. Está sendo uma trabalheira enorme manter o equilíbrio desequilibrado pela sua passagem por mim.
Então, como sei que o tempo urge e não nos dá oportunidade de repetir um gesto, mesmo sendo ele o mais simples possível, se torna impossível; estou lhe entregando esta carta para que isso tudo chegue às suas mãos, aos seus olhos e ao seu coração. Pois aos escravos do tempo não lhes é permitido parar de correr de um ponto a outro, sem parar em nenhum deles, e como não terei tempo para chegar aos seus ouvidos para colocar o meu amor onde ele deve ser colocado, coloco-o aqui, para que ele permeie os seus olhos e eu deixe de ser um ilustre desconhecido e passe a ser visível para voce, Pilar...


Apressadamente, Ilustre desconhecido...



Xico Fredson...

Balada do Indeciso


Pra quem anda distraído pelas ruas da cidade, medindo com os olhos a altura dos prédios; analisando através das sacadas a quantidade de alegria e de preguiça que pode haver em uma manhã fria. Observando as pessoas diversas, pessoas estranhas, pessoas parecidas, Pessoas, que lhe dão a medida exata da sua solidão e de sua tristeza, diante de tanta coisa fascinante e estranha, e colorida, e indiferente, e sem raiz... Hoje o dia está tão nublado, acho que vou assoviar por aí, chutar algumas latas, andar por algumas praças, ver as pessoas que tanto gosto de ver, mesmo sem ser visto por elas, e cantar essa Balada do Indeciso.
De quando em quando, gosto de me sentir mais um...ser invisível aos olhos da grande cidade que parece acordada, mas que dorme ao som de sirenes, gritos de socorro, declarações de amor, gemidos, gestos obscenos, piscadelas no calçadão, novela das oito, serenatas à moda antiga, rádios ligados que embalam a alta madrugada, denunciando que alguém acredita no que faz, e que não está só, pois está ouvindo a voz de um estranho através de ondas longas e curtas, ou seja, estão unidos pela mesma fé professada através da AM ou FM.
Nessa grande cidade Grande, que acorda quando dormimos e dorme quando acordamos, ou que não dorme nunca, porque nela não se dorme! É nela que vou andar durante o dia, esperando a noite cair, com a mesma leveza de um lenço que cai no chão à espera de uma mão que o apanhe e sinta o seu cheiro. Vou esperar o dia passar assoviando Beatles, lendo Drummond e Xico, e procurando a pluralidade que talvez exista entre os dois: quem sabe não nasceram para ser Gauches nessa vida. Mesmo que o primeiro seja o Gauche mais conhecido e mais lido. Vou dobrar mais uma esquina como quem vira uma página dum livro, ou dança outro ritmo num mesmo Baile...
Não!, Acho que não quero ser Gauche nessa vida, pois para mim, a poesia é uma grande inutilidade, não concordas Mariana? Veja bem: com ou sem ela o mundo seria tal qual o é, sem mais nem menos. A vida passaria do mesmo jeito, com o seu mesmo ritmo lento ou frenético, depende do lugar em que você descida morar, Mariana. Quanto as pessoa? Bom, elas não seriam melhores ou piores ao sabor das poesias ou filosofias de vida. Elas seriam o que nasceram pra ser, nem mais, nem menos, apenas isso, sua medida exata, seus vinte e um gramas de pura existência sofrível e vivível e amável. Continuariam a esbarrar umas nas outras com a mesma pressa cotidiana. Com a mesma indiferença rotineira. Com o mesmo sorriso aparelhado e burocrático, preso com ligas coloridas, e estampado num rosto que reflete o cinza metálico das grandes cavernas em que nos tornamos...
Ahhh e os casais? Eles se gostariam mais se todos os dias um deles ou quem sabe os dois, contrariando a lógica da vida moderna, recitassem ao invés de uma oração, um poema do Vinicius? Ou será que se (des)gostariam ou se desgastariam da mesma forma se o ritual não fosse realizado? E se não existisse aquela música que faz lembrar daquela pessoa, daquele lugar, daquele momento, daquela carícia, daquelas palavras ditas no calor e na ânsia das coisas impensadas... E se isso, e se aquilo, e se aquilo outro? Será que mesmo sem música, sem flores, ou sem poesia lembraríamos sentiríamos, quereríamos, arrebatar-nos-íamos para os mais distantes e escondidos lugares da lembrança, os mesmos momentos, etc, etc, etc?
Com ou sem essas tolices, as coisas seriam apenas coisas para se carregar, como malas em aeroportos, ou rodoviárias, para quem não descobriu ainda a delícia de voar! A vida teria o mesmo sentido de quando nascemos, o mesmo sentido que terá quando morrermos. E eu que estou escrevendo esse monte de coisas desconexas? Bem, Mariana, eu continuarei assistindo a tudo, e assoviando uma canção, e lendo poesias, amando, e vendo as pessoas se esbarrarem, e rindo delas e de tudo mais que aparecer. Continuarei a ser tolo e gauche, a mandar flores, a recitar poesias a filosofar em mesas de bar, pois eu sou tudo isso, e em nada disso creio e tudo isso faço, por quê? Sei lá, mas é bom, é confortante ser tolo, pois não posso fugir à minha condição de Poeta, mesmo sem querê-lo...
Xico Fredson